quinta-feira, 26 de novembro de 2015

A HORA É DA MINISTRA DA JUSTIÇA, FRANCISCA VAN DUNEM, E DA SECRETÁRIA DE ESTADO ADJUNTA E DA JUSTIÇA, HELENA RIBEIRO.

A justiça está sempre na crista da discussão política, seja qual for o Governo empossado. Todos prometem mudar tudo, resolver problemas, afastar constrangimentos ou dar mais claridade a obscuridades legislativas.
No fundo, cada Ministro da Justiça começa com a sua visão dos problemas e tem vários possíveis caminhos para os solucionar, sabendo que a política é a arte do possível, atendendo à sempre escassez de meios.
Uns têm uma visão teórica desses problemas, porque os desconhecem efetivamente - são os casos dos membros do governo mais políticos, tendo construído as suas carreiras ou nos corredores do parlamento ou fora da prática judiciária. Outros, pelo contrário, têm uma visão mais concreta, por conhecerem precisamente essa prática judiciária, ou como advogados, ou como magistrados. E mesmo neste último grupo de "práticos" temos os que acham poder resolver os problemas legislando, legislando e legislando.
É resultância de tudo o que aqui disse que não vi ainda, em nenhum governo, uma verdadeira vontade, um verdadeiro empenhamento em ir ao cerne e à raiz efetiva dos problemas para os concretamente atacar. E a justiça vem acumulando problemas, dificuldades e obscuridades, muito fruto das claríssimas faltas de investimento que a chamada justiça pública [ao contrário do investimento na chamada justiça "privada" da arbitragem, sobretudo no setor público] vem sendo votada precisamente pelos sucessivos governos desde 1974.
Desta vez, não escondo, é com redobrada expetativa que olho para os novos titulares das pastas da justiça.
Estou, confesso, a atribuir-lhes um enorme capital de confiança e quando assim é, ou seja, quando as expetativas se elevam muito, por regra, acabamos defraudados.
Quero, contudo, acreditar que não. Que alguma vez existirá uma exceção para confirmar a regra!
O perfil e o CV da nova Ministra da Justiça, pela sua forte ligação ao terreno judicial, na qualidade de procuradora distrital de Lisboa e a nova Secretária de Estado Adjunta e da Justiça, a Juiz Desembargadora Helena Ribeiro, acalentam-me uma enorme esperança.
A justiça não é só a justiça penal, apesar de a justiça cível e a administrativa e fiscal terem com ela muitos problemas comuns: a falta de funcionários judiciais, a falta de juízes em algumas áreas [jurisdição administrativa e fiscal é disso o exemplo mais flagrante, sendo responsável, aliás, pela inexistência sequer de uma bolsa de juizes], a falta de dotação dos Tribunais de um corpo de assessores e os gravíssimos problemas dos sistemas informáticos de suporte aos Tribunais [CITIUS e SITAF] são alguns dos constrangimentos que não contribuem para que a justiça responda às necessidades dos nossos concidadãos.
Em suma, a esperança abre horizontes infinitos e possibilidades imprevistas. O futuro é absolutamente aberto. Sempre. É nisto que confio.

Termino citando Victor Hugo:

"... A esperança é a mão misteriosa que nos aproxima do que desejamos e nos afasta do que tememos...".

 

domingo, 8 de novembro de 2015

O SISTEMA JUDICIAL NOS E.U.A. GENERALIDADES QUE VALE A PENA RELEMBRAR!

HISTÓRIA DO SISTEMA JUDICIAL DOS E..U.A.
 
O ordenamento jurídico dos Estados Unidos foi baseado inicialmente no modelo em vigor na Inglaterra durante a colonização, compreendendo a statute law, complexo de normas escritas, o common law [os costumes confirmados pelas decisões judiciais e apoiados na ideia de que a sua prática reiterada trazia a certeza de sua obrigatoriedade], além da equity, utilizada de forma complementar.
Pois bem, a Constituição norte-americana dispõe que o exercício do poder judicial far-se-á pela aplicação do common law e da equity (Secção II, do art. 3º). Aqui o direito inglês teve uma forte influência neste sistema americano que, até 1873, aplicava separadamente o common law e a equity. De facto, na época da colonização da América do Norte havia em Londres três tribunais:
i) o do Banco do Rei,
ii) o das Causas Comuns [Tribunais de Justiça com a atribuição de aplicar o common law],  bem como
iii) o da Equidade, que decidia segundo os precedentes fundamentados na equity.
Por outro lado, desde o século XIV que se admitiam na Inglaterra petições ao rei em casos de flagrante injustiça, invocando-se a incidência do common law. Por isso de diz que o common law se iniciou nesses King's Courts, em contraposição com o direito legislado, compreendendo aqui o civil law e o statutory law, [complexo de normas aplicadas pelos tribunais dos países de língua inglesa].
O sistema do common law trazia algumas dificuldades à adequação do Direito à evolução social, já que a demora para se introduzir um novo conceito que redefinisse uma noção anterior era desalentadora. De facto, o common law dá mostras de ineficiência e é por isso que o sistema assente na equity se desenvolveu mais.
A solução encontrada para harmonizar os dois sistemas foi, muito naturalmente, a coexistência dualista entre ambos. Com o passar do tempo, todavia, a equity foi perdendo o seu conteúdo supletivo e a sistematização das suas normas foi-se tornando tão rígida quanto a que ocorre com o common law.
Neste período de uma certa rotura do common law e da equity apareceu com força a lei como ferramenta do poder absolutista que acabou por remodelar o common law. Assim, da convivência de ambos os sistemas – common law e equity – surgiu um modelo que, tendo a lei como uma das fontes do Direito, fez surgir o moderno common law, desenvolvido e utilizado pelos países colonizados pelo Reino Unido, em especial os Estados Unidos da América.
Por fim, o Direito anglo-americano caracteriza-se também pela stare decisis, fundamentada fortemente nos precedentes, especialmente com relação ao Direito Privado. O termo stare decisis, na realidade, significa decisis et non quieta movere, que considera a importância da adesão aos precedentes e a não modificação daquilo que já está estabelecido, ou seja, os tribunais pouco interferem nos princípios anunciados em decisões anteriores, embora se possa decidir de outra forma em situações e causas que introduzam casos substancialmente distintos e novos.
Assim, baseados no common law, os precedentes constituem, hoje, a regra adotada pelos tribunais norte-americanos. Os case law formam o universo de normas e princípios que fornecem as orientações às decisões judiciais.
Seguindo a doutrina do stare decisis, tais decisões assumem efeito vinculante para litígios supervenientes, salvo se ocorrer alguma diferenciação nas novas situações ou se forem modificadas por outra decisão (overruled). As decisões judiciais são regularmente publicadas nos chamados reports, que formam a base para pesquisas legais futuras.
 
MAGISTRATURA JUDICIAL AMERICANA
 
Os juízes norte-americanos podem ser recrutados entre advogados, promotores, professores das escolas de direito ou políticos, podendo entrar para o Judiciário, seja estadual ou federal, em qualquer nível, não havendo sistema de promoções.
Para qualquer europeu na dita "Europa desenvolvida e progressista", o sistema de escolha dos magistrados nos E.U.A. perturba a absoluta e decisiva separação de poderes, enquanto garante de uma sociedade igualitária, justa e democrática, onde efetivamente TODOS são iguais perante a lei e onde nenhum dos poderes está submetido ou dependente ao outro.
 
Na verdade, nos E.U.A. existem três formas de escolha dos juízes:
  1. Por indicação do Poder Executivo, com posterior confirmação pelo Poder Legislativo, sendo este o modelo mais adotado na Justiça Federal e em alguns Estados.
  2. Os juízes também podem ser indicados pelo Poder Executivo de entre os nomes de uma lista preparada por uma comissão independente.
  3. Por fim, os juízes também podem ser escolhidos mediante eleição popular.
O MINISTÉRIO PÚBLICO NOS E.U.A.
 
No sistema federal, os promotores públicos são parte do Ministério da Justiça dos EUA (U.S. Department of Justice), que pertence ao poder executivo.
O Procurador Geral da República (Attorney General of the United States) chefia o Ministério e é nomeado pelo Presidente, com confirmação do Senado.
Os promotores chefes dos vários tribunais federais são chamados United States Attorneys e também são nomeados pelo Presidente, com confirmação do Senado. O Federal Bureau of Investigation (FBI), que investiga crimes contra os Estados Unidos, faz parte do Ministério da Justiça.
 Cada estado tem também um procurador geral no poder executivo estadual, que geralmente é eleito pelos cidadãos daquele estado. Existem também outros procuradores em diferentes regiões dentro dos estados, chamados state attorneys ou district attorneys. Esses promotores públicos também são geralmente eleitos.
 
ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA AMERICANA
 
A estrutura dos sistemas de tribunais estaduais varia conforme o estado. Cada sistema tem características singulares, mas podemos fazer algumas generalizações. Para compreender a organização judiciária norte-americana, é necessário estabelecer uma linha divisória entre a Justiça Federal (Federal Courts) e a Justiça Estadual (State Courts). A organização judiciária tem na sua base as trial courts (primeira instância), depois as cortes de apelação (para o affirm ou reverse) e no topo o Supreme Court.
Na esfera cível, apenas um décimo dos casos é efetivamente examinada pelos tribunais, em função dos acordos prévios entre as partes (settlement). Já no âmbito criminal, apenas dez por cento dos casos são levados a julgamento, por conta das inúmeras desistências da promotoria, pela via das negociated plea (ou seja, confissões de culpa em troca de diminuição da pena).
Talvez assim explicado este sistema se perceba porque os processos não demoram o tempo que no sistema judicial português demoram. É que apenas uma ínfima parte dos processos efetivamente chegam a julgamento.
Além disso, existe o tribunal de júri, previsto constitucionalmente. Tal instituição já apreciou questões de direito, mas hoje examina apenas matéria de facto. Nos casos criminais, o tribunal de júri julga crimes de maior potencial ofensivo, as chamadas felonies. Já em matéria cível, ele é convocado para julgar danos materiais (money damages), perda de propriedade (recovery of property) e danos gerais por culpa ou dolo (torts).